PROMESSA DE VIDRO
TEXTO: ANDRE CORREIA
ILUSTRAÇÃO: ADILSON CTS
Não havia quase nada naquele aposento além de uma janela que permanecia
fechada, uma cadeira e, no meio do salão, o objeto mais notável: um caixão de
vidro. Roselyn estava ao lado do caixão observando quem estava dentro
dele.
- Quanta falta eu sinto de você – disse Roselyn. - Minha vontade é
deitar aí ao seu lado. Por que você me deixou? Você prometeu que
voltaria para mim e eu acreditei. Acreditei, mas te vi escorrendo de meus
braços.
E ela ficava ali como que se esperasse uma resposta. Continuou observando
e teria ficado naquele lugar por mais tempo se não tivesse sido interrompida
pelo barulho de alguém batendo na porta. Deveria ser importante, pois seus
criados sabiam que ela não gostava de ser incomodada quando estava ali dentro.
- Um momento – gritou.
Deu uma ultima olhada para o caixão. A moça continuava lá da maneira que
estava desde que foi colocada. Seu corpo não se deteriorou e nem envelheceu.
Continuava bela como sempre fora. Roselyn se despediu com um beijo na tampa do
caixão e se dirigiu á porta. Ao abri-la deu de cara com seu Rubens, seu
mordomo.
- O que deseja Rubens?
- Desculpe-me o incomodo minha Senhora, mas Mr. Hogan está aqui para vê-la
- Mr. Hogan? Pois bem, diga a ele que eu o espero na biblioteca.
- Sim Madame.
--------------------
Mr. Hogan entrou na biblioteca. Já estivera ali antes. A estante de
livros empoeirados. O bar com as mais variadas bebidas e a mesa cheia de papeis
com anotações. E, assim como das outras vezes, haviam os corvos. Vários deles.
Entravam e saiam pela janela que ficava atrás da mesa. Alguns pousavam sobre
ela, outros sobre a estante, alguns no bar e ainda outros pousavam pelo chão.
Ele nunca gostou disso. Achava aquilo repugnante. E sentada em uma cadeira atrás
da mesa estava Roselyn. Com seu ar de superioridade que constrangia quem
olhasse para ela. Mesmo depois de alguns encontros, Mr. Hogan ainda não estava
acostumado. La estava ela, com seu sorriso malicioso que junto com a presença
dos corvos, dava um ar assustador ao ambiente.
- Ola Mr. Hogan
- Ola Roselyn.
- Á que devo a honra de sua visita? Espero que traga noticias.
- Infelizmente ainda não consegui localizar o item que me pediu.
A expressão de Roselyn se alterou. Seu rosto agora estava fechado e seu
olhar parecia arder em chamas:
- Não preciso que venha até mim relatar seu fracasso.
- Você tem que entender. O que me pediu não é fácil. Não se vê um desses
á venda no mercado. Roselyn se tornava cada vez mais fria. Mr. Hogan então
continuou.
- Bom, na verdade, encontrei uma pessoa. Ele é bom. Falou que pode
realizar uma busca. Mas vou precisar de dinheiro.
- Acho que já lhe dei dinheiro o bastante para tão pouco retorno.
- Entenda minha cara, essas coisas são difíceis de se conseguir mas se
me der mais tempo...
- Seu tempo acabou Mr. Rubens
- Como assim?
- É isso mesmo que entendeu. Está dispensado
- Mas foi você mesmo quem disse que faria de tudo.
- Sim, mas fazer tudo buscando um objetivo é diferente de gastar meus
recursos em vão. Agora pode se retirar.
- Não pode fazer isso comigo.
- Foi um prazer Mr. Hogan.
Mr. Hogan então se levanta e, apoiando os braços na mesa, inclina-se na
direção de Roselyn e começa a esbravejar:
- Não pode me dispensar como um cachorro depois de tudo que eu fiz! Eu
sei o que você faz aqui! Sei das suas atividades deploráveis! E conheço muita
gente que não ficaria nada contente com isso!
- Por acaso está me ameaçando?
- Apenas estou colocando as cartas na mesa. Não aceitarei ser
descartado.
Roselyn permaneceu calada olhando para Mr. Hogan. Ele então se levanta e
se prepara para retirar-se:
- Isto não ficará assim Roselyn.
Ao se virar ele se depara com um bando de corvos bloqueando a passagem
da porta.
- Criaturas miseráveis.
Mr. Hogan repara então que em toda a sala há mais corvos do que tinha
quando entrou. Não estão mais saindo e entrando pela janela. Estão todos
olhando fixamente para ele. Com um frio subindo pela espinha ele olha para
Roselyn. Ela permanece com a expressão inalterada, parecendo os próprios corvos
encarando Mr. Hogan. Então aquele sorriso malicioso surge em seu rosto. Neste
instante os corvos avançam sobre o homem que mal tem tempo de reagir. Infinitas
bicadas atingem seu corpo. Ele grita enquanto eles beliscam e arrancam pedaços
de sua carne. Logo não se pode mais ver o homem no meio de tantas aves negras.
Os gritos se tornam mais estridentes até que finalmente cessam.
--------------------
Roselyn está novamente ao lado do caixão de vidro. Suas mãos deslizam
sobre a superfície fria enquanto ela observa a moça que parece absorvida num
sono tranquilo, como se pudesse acordar á qualquer momento.
- Ó minha querida. Sei que pode me ouvir. Sei que enquanto falo
suavemente pode se lembrar de mim. Estaremos juntas novamente um dia. Eu irei
achar um jeito de te trazer de volta. Eu prometo minha irmã.
Nenhum comentário:
Postar um comentário